T’Pol: Uma paixão

| por Antonio Mormile (edição e revisão: Waldomiro Vitorino)

Sentimentos: eles acontecem, podemos racionalizar, tentar falar sobre, mas o fato é que acontecem independente de nossa vontade e é muito difícil controlá-los. Podemos escondê-los, tentar reprimi-los, mas na grande maioria das vezes eles nos tomam e o que nos resta é vivenciá-los. Podemos ter sentimentos por coisas, por animais, por pessoas. Muitas vezes quando o sentimento é por uma pessoa temos que sublimá-lo ou usar, mesmo que inconscientemente, outros mecanismos psicológicos para lidarmos com ele para que não soframos. Tentar escrever sobre um sentimento é um risco e uma dificuldade muito grande. Vou correr esse risco e falar de paixão, uma paixão que eu tenho, pois afinal quando você tem um sentimento bom como esse, você quer que o mundo inteiro saiba. O inusitado é que o objeto dessa minha paixão sequer existe na vida real, é uma personagem da série “Star Trek: Enterprise”, a vulcana T’Pol.

Star Trek: Enterprise Jolene Blalock as Sub-Commander T'Pol Source: Space / CTV Inc.

Não foi paixão (ou a palavra certa seria amor? Porque não?) à primeira vista, no início era uma simples atração física pela belíssima imagem da personagem, seu rosto mais do que lindo, as formas esculturais do seu corpo, a voz sedutora (na versão dublada isso se perde um pouco). Mas o sentimento foi tomando forma e aumentando a cada novo episódio que eu assistia, a admiração não era mais somente pelo físico mas também pela personalidade, pelos jeitos e trejeitos, pelas atitudes e comportamentos, pelas crenças e valores, pela postura, pela coragem, enfim pelo conjunto da obra.

De início temos que considerar, que essa mulher vulcana, enfrenta as dificuldades de morar e trabalhar num planeta estranho. Em 2149 é designada a trabalhar no Consulado Vulcano aqui na Terra, longe dos seus familiares e amigos, longe dos seus iguais, o que para ela já era um sacrifício. Para piorar (e muito sua situação) em 2151 é escolhida e aceita embarcar em uma nave onde será a única de sua espécie, cercada de humanos, tornando-se assim a primeira oficial vulcana a trabalhar em uma nave terrestre (antes mesmo do Sr. Spock): a Enterprise NX-01, a primeira nave da Terra a explorar o espaço profundo.

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Trabalhar em um espaço confinado rodeada de humanos, que tem emoções descontroladas, um senso de humor muitas vezes inconveniente, com uma cultura totalmente diferente, com comportamentos e atitudes tão estranhos a ela, seres que nutriam uma enorme desconfiança sobre ela, enfim, com seres tão diferentes, onde até o cheiro deles a incomodava não foi uma tarefa nada fácil, muito pelo contrário. Mas seu senso de dever e sua lealdade a fazem aos poucos se adaptar, mais do que isso aos poucos com suas qualidades (algumas eu que já citei), ganha a confiança e mais do que isso o respeito de todos.

Para mim a personagem é extremamente bem construída e a atriz, Jolene Blalock o desempenha de forma primorosa. Diferente do Sr. Spock que passa uma imagem de um ser quase infalível, quase perfeito, a sub-comandante T’Pol mostra ser um ser vivo como qualquer outro, falível e cheia de imperfeições. Podemos falar aqui do seu vício em Trellium, e embora alguns gostem de afirmar que foi o vício que a fez por vezes perder seu controle das emoções e sentimentos, eu tenho a convicção de que suas demonstrações de afeto em relação ao engenheiro chefe Trip, por exemplo, foram muito mais pelo fato dela ter absorvido traços da cultura humana, pela sua personalidade e ousadia do que ao vício. Coisas como essa é que a fazem parecer para mim um ser “crível”, passível de ser “real”.

O fato é que quando ela está em cena acaba sendo o foco de todas as atenções, mesmo permanecendo calada, sua beleza ofusca tudo em volta, e essa é uma opinião não só minha, mas de pessoas com quem falei sobre e a internet está cheia de opiniões similares.
Alguns dizem que as cenas mais “calientes”, com teor sexual, explorando sua beleza, seu corpo foram uma apelação dos produtores para ganhar audiência, e sem dúvida ganharam, mas para mim estão longe de ter sido uma apelação, as encaro como perfeitamente aceitáveis, bem feitas e lindas, encaixadas no contexto em que se desenvolve a estória da personagem, mas se quiserem persistir nessa idéia, eu digo, se você tem uma atriz/personagem lindíssima, sexy, atraente por que não usar isso, afinal no fim das contas estamos falando de uma série de tv que visa o entretenimento.

tpol

Mas deixando um pouco de lado os atributos físicos voltemos aos atributos de personalidade. Como já disse esse sentimento de paixão foi sendo amadurecido no decorrer dos episódios e como qualquer sentimento teve momentos de extrema identificação e admiração, mas também momentos em que foi colocado em cheque. O episódio “Fusion” (S01E17), despertou/desperta em mim questionamentos. Ela deixa de meditar por uma noite (a pedido de um vulcano que interpreta os ensinamentos de Surak de forma alternativa tentando não reprimir, mas sim vivenciar os sentimentos mantendo-os sob controle) e isso acaba levando-a a ter um sonho e a princípio vulcanos “tradicionais” não sonham. Se por um lado isso revela seu lado ousado e corajoso, por outro revela também um certo tom de irresponsabilidade pelo risco envolvido. Tudo isso se agrava quando ela permite que esse vulcano estabeleça um “elo mental” com ela, prática não aceita na sociedade vulcana daquela época (na época do Sr. Spock elos mentais vulcanos se tornaram prática comum). O elo faz com que ela passe a ser portadora da síndrome de Pa’nar. Nos primórdios da história vulcana o elo era praticado e a síndrome tinha cura, mas essa cura se perdeu no tempo e naquele momento portadores da síndrome eram discriminados, estigmatizados, considerados cidadãos de segunda classe (não vou falar sobre a insinuação que tudo isso faz querendo traçar um paralelo com o HIV, não é o caso aqui). O importante é citar que depois de um longo tempo ela é curada pela vulcana T’Pau, que apenas com a pratica um elo mental resolve tudo.

Estou relatando tudo isso pois, como disse acima quando vi o episódio pela primeira vez surgiram questionamentos em mim, mas o que quero dizer é que seus comportamentos e atitudes só reforçaram a paixão que já sentia. Para mim o que fica é que apesar de ser uma vulcana que a princípio reprime seus sentimentos, como é o “normal”, ela está repleta deles e são sentimentos que vão dos mais sublimes, como ter burlado o protocolo e ter ido a um bar em São Francisco, na época que trabalhava no consulado, atraída pelo Jazz que estava sendo tocado, até a transa que tem com Trip episódios mais a frente.

Quero destacar também dois episódios, o primeiro por ser na minha opinião um dos mais legais e divertidos de toda série, “Carbon Creek” (S02E02). Estão compartilhando uma refeição, Archer, Trip e T’Pol e ela acaba revelando que diferente do que os livros de história humana contam, o primeiro contato humanos/vulcanos ocorreu na verdade em 1957 e que uma antepassada sua participou do mesmo. Para nosso deleite a própria Jolene Blalock representa T’Mir, sua “tataratataravó”. Ela aparece a maior parte do tempo com as orelhas cobertas pelo cabelo e em roupas humanas da época. O segundo é “Twilight” (S03E08) pois nesse episódio se delineiam detalhes e traços marcantes da personalidade da sub-comandante: lealdade, gratidão, persistência. T’Pol cuida do capitão Archer que não consegue reter memórias recentes e por mais de uma década tem que conviver com ele tendo que recontar com paciência e dedicação, dia após dia a história dos últimos anos, pois a cada novo dia Archer esquece o que aconteceu nesse tempo (a estória se desenrola fora do domínio espaço/tempo “normal”). Além de nos proporcionar uma T’Pol, linda demais como sempre, só que de cabelo mais cumprido e de rabo de cavalo.

Outro momento crucial é o que ela é chamada por seu povo a deixar a Enterprise e desobedecendo as ordens, numa demonstração de lealdade ao capitão Archer e a missão que está envolvida e provavelmente a identificação que desenvolveu com os humanos, resolve permanecer na nave perdendo assim seu comissionamento vulcano e partindo na missão para salvar a terra da ameaça Xindi, como recompensa em sua volta recebe a patente de comandante da Frota Estelar.

Não posso deixar de falar da relação T’Pol x Trip. Um “X” entre os dois nomes acho que caracteriza bem os acontecimentos. O jogo da conquista entre dois seres da mesma espécie já é bastante complicado, imagine entre seres de raças diferentes, que nunca antes haviam tido esse tipo de contato, ou seja sem referências e ainda por cima numa situação de confinamento e em muitos momentos vivendo situações de guerra, bota complicado nisso. Nós humanos não temos como hábito constante como eles reprimirmos os sentimentos, mas é muito comum nessas situações de conquista, sedução, os escondermos, é comum pensarmos que se demonstrarmos abertamente nossos sentimentos acabamos gerando desinteresse no parceiro. Trip tenta jogar esse jogo com todas as suas armas (perdi a conta de quantas vezes fui empático, e me colocando no lugar dele pensar em como encontrar a melhor saída para obter sucesso) e ela também joga pesado, afinal para ela é comum não demonstrar as emoções.

star trek trip sim enterprise tpol

No episódio “Harbinger” (S03E16), temos a famosa cena dela deixando cair o sensual robe de cetim, mostrando, infelizmente só de costas, seu corpo lindo, escultural e em seguida consumando a transa, pelo menos para mim tão esperada (pena que as cenas rolam só na nossa imaginação). Na primeira conversa que eles tem após o acontecido, Trip espertamente pede para ela falar primeiro sobre o que aconteceu e ela o agradece, ele sem entender fica esperando o que ela vai dizer. O agradecimento é por ele ter proporcionado a ela a oportunidade de explorar a sexualidade humana (que difícil!). Mas fica claro que a atração e também o sentimento de ambos está rolando.

Claro, eu como mero expectador o máximo que poderia querer (já que infelizmente não tenho a menor chance) é que tudo isso terminasse de forma feliz com os dois juntos, infelizmente o final que nos mostraram foi patético, com a morte dele ficamos sem saber o que poderia ter acontecido. De qualquer forma para mim o fato da personagem conceder o direito de experimentar sentimentos, emoções e prazer sexual a torna, como já disse anteriormente, um ser vivo muito mais crível, “alcançável”. Antes de encerrar esse assunto, note que ela se relaciona sexualmente com ele fora do Pon Farr (para simplificar o “cio” vulcano que acontece a cada 7 anos). Só para registro, T’Pol é levada a passar por um Pon Farr não natural, mas por ter sido exposta a bactérias que o desencadearam, o episódio é “Bounty” (S02E25). Cronologicamente, T’Pol e Trip são o primeiro casal humano/vulcano da franquia. O outro casal famoso são os pais de Spock, claro.

Acho que deixei claro minha paixão e embora seja uma personagem, sequer é uma mulher real (a paixão podia ser pela atriz Jolene Blalock, da mesma forma inatingível, mas uma pessoa real), mas aconteceu pela personagem, e é uma paixão real, realmente sinto.

Não vejo outra forma de terminar:

Eu não teria como não me apaixonar por essa mulher!!!

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       ANTONIO MORMILE




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